Sergio Cruz Lima

"Quero, já!"

Sergio Cruz Lima
Presidente da Bibliotheca Pública Pelotense
[email protected]

Aos dez anos de idade, escreve Boulanger, o menino Pedro tem beaucoup d´esprit naturel, une mémoire heureuse et un jugement peu commun. Sim, o menino é precoce na inteligência, fraco de corpo, cada vez mais Áustria no amor ao estudo, notavelmente Bourbon pela memória tenaz e sujeito, na crise de crescimento, a acidentes epileptiformes que lhe denunciam a herança paterna. No físico, de fato, Pedro nada tem dos parentes lusitanos. É loiro, prognata, macrocéfalo, delgado e manso como un petit arquiduque. Os seus retratos, aos 14 anos, lembram o primo-irmão, Duque de Reichstadt; já aos 23 os primos Maximiliano, que morreu no México, e Francisco José, o imperador longevo. A imperatriz Leopoldina, sua mãe, marca-o vivamente com a sua espiritualidade e a sua raça: nos olhos muito azuis, no ouro velho dos cabelos, no queixo dinástico, na fronte alta, cujo abaulado adquire, nos retratos da falecida, o prestígio de linha característica _ sobremodo no apetite de leitura, na propensão para as atividades mentais, nos costumes austeros, tão longe das tradições da casa de Bragança.

Iniciam-se, agora, as latinidades, o domínio da língua francesa, os estudos de inglês e história. Com Roque Schuch, Pedro estuda literatura; com Damby aprende equitação e o coronel Luís Alves de Lima e Silva, futuro Duque de Caxias, ensina-lhe esgrima. Letras e artes se apresentam. Schuch é professor de alemão, Boulanger, de francês, Lacombe é mestre de dança, Maziotti ensina-lhe música, Araujo Viana, literatura portuguesa e Taunay, coisas estéticas. Aos 14 anos, Pedro fala quatro idiomas e lê tudo. Devora livros, numa ânsia de entendê-los, num gosto de instruir-se que nenhum outro tipo de passatempo chama mais a sua atenção.

O dia do agora jovem dom Pedro é sempre o mesmo. Levanta-se às 7h, almoça às 8h, estuda das 9h às 11h. Antes do jantar, às 14h, com o médico ao lado, o camarista e a camareira-mor, discute temas "científicos ou de beneficência". Após o jantar, dá um passeio moderado, sem saltos nem correrias, até o crepúsculo, quando se recolhe para ler. Às 21h, faz as orações da noite, às 21h30min, ceia, às 22h deve estar na cama. O dia seguinte, como disse, será igual ao anterior. O regulamento, a camareira-mor, o camarista, o médico, todos impecáveis, as palestras pensadas com precedência, como os pratos: tudo quieto, regrado, previsto.

Pouco antes de completar 15 anos, em razão do fracasso político da Regência, o Clube da Maioridade se movimenta e dom Pedro recebe, plácido, uma comissão emancipatória. Escuta-lhe, sem pestanejar, a mensagem. Ouve o seu tutor, Marquês de Itanhaém, e o seu aio, Frei Pedro de Santa Mariana. Volta, de decisão tomada, e declara a sua concordância com a petição. Ao chegar, o regente Araújo Lima pergunta-lhe: "Aceita Vossa Majestade Imperial assumir o governo do país em 2 de dezembro, data em que V.M.I. completa 15 anos de idade, ou quer já?" De pronto, dom Pedro responde-lhe. "Quero, já!". No paço, circula a feliz notícia. Dom Pedro II começa o seu reinado!

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Anterior

Cinema e modernidade

Próximo

Lei do Sossego: novos capítulos virão

Deixe seu comentário